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sexta-feira, 29 de março de 2024

Por trás dos spots midiáticos de Renzi, o programa neoliberal de sempre

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17/09/2014 10h45 – Atualizado em 17/09/2014 10h45

Fonte: Brasil de Fato

LOGO APÓS as férias de verão – que a maioria dos italianos passou na própria residência por falta de dinheiro –, con­cluiu-se o primeiro semestre do governo de Matteo Renzi, que integra uma coali­zão formada pelo “Partido Democrático” (PD, ex-PDS e ex-PCI) e três pequenos partidos de centro-direita: o “Novo Cen­tro-Direita” (NCD), que Angelino Alfano criou em novembro de 2013 após romper com Berlusconi e a ala pós-fascista de Forza Itália, os “Populares para a Itália­-UDC” e a “Escolha Cívica”, que é a for­mação política do ex-primeiro-ministro Mario Monti.

Nesses primeiros 15 dias de setembro, o jornal independente Il Fatto Quotidia­no publicou uma série de artigos que en­focavam as promessas do primeiro-mi­nistro, Matteo Renzi, e as poucas pers­pectivas que o governo tinha para, de fa­to, realizar as reformas prometidas. Por isso, apenas o Jornal do PD, Europa e o falimentar L’Unità – que em outros tem­pos foi o jornal do PCI criado por Anto­nio Gramsci –, hoje, exaltam o desempe­nho institucional do governo Renzi, jus­tificando em mil maneiras o atraso e a inexistência no Parlamento de verdadei­ras propostas de lei para votar as tão fa­ladas reformas.

Um contexto que, de repente, se acen­deu provocando a intervenção de todos os meios de informação italianos, logo após Renzi, ao participar no programa de TV Porta a Porta, inventar uma nova fór­mula institucional para permanecer no cargo sem enfrentar novas eleições, ao dizer que precisa “de mais 1.000 dias pa­ra fazer as reformas”.

Diante desse fato, que é uma conse­quência das maquinações do lobby ma­çônico o qual Renzi pertence e à arro­gância das excelências do mercado que monitoram grande parte dos ministros, o co-diretor do Il Fatto Quotidiano, Marco Travaglio, escreveu três editorias que, na prática, desmascararam a iden­tidade política do seu governo, demons­trando que o novo PD de Renzi, na prá­tica, teria abandonado os ideais de cen­tro-esquerda, para se tornar um parti­do de centro, potencialmente voltado a contrair alianças com os outros partidos de centro-direita e da própria direita de Berlusconi.

Não tendo o rabo preso, nem com o lo­bby da economia, nem com os “círculos das excelências da política” e tampou­co com os serviços de inteligência, Mar­co Travaglio, ao participar no programa de TV Servizio Pubblico, sem meios ter­mos declarou: “Agora acabou o festival das mentiras do governo Renzi. Depois de tantas palavras, de tantas metas a se­rem alcançadas, de tantos programas e propostas, enfim, depois de tanto blá blá blá, nenhuma reforma estrutural foi re­alizada e nenhuma medida séria foi to­mada para retirar a economia italiana do pântano da crise, que é uma crise tipica­mente italiana que explodiu devido a me­didas impostas pela Alemanha e pela trí­ade, isto é, o FMI, o Banco Mundial e o Banco Central Europeu (BCE).

Reformas ou privatizações?

É bem verdade que, nos últimos 20 anos, todos os governos, os da direita, chefiados por Berlusconi, ou da centro­-esquerda, liderados por Prodi ou D’Ale­ma, nada fizeram em termos inovadores, permitindo que as instituições (governo nacional, governos regionais, juntas pro­vinciais e governos municipais) se trans­formassem em autênticos bancos de en­saios para negócios ruins ou ilegais, por excesso de asneira ou de corrupção.

Um cenário que, já em 2008, quan­do explodiu a crise da bolha financeira, apresentava com muitas evidências to­das as problemáticas que, hoje, estão em­purrando o país cada vez mais em dire­ção a uma recessão mais tenebrosa.

E por qual motivo Berlusconi, Prodi ou D’Alema nada fizeram para impedir o crescimento do desemprego? Por qual motivo nada foi feito para estabilizar a si­tuação do débito público e em particular para reduzir os custos da política ou da máquina estatal?

A verdade é que, hoje como ontem, é o “poder” que impede e inviabiliza qual­quer tipo de mudança institucional, so­bretudo, as reformas que poderiam mo­dificar a dependência que o Estado italia­no tem com a tríade FMI. Banco Mundial e BCE, no âmbito financeiro, com a Ale­manha/União Europeia, em termos de planejamento da economia e com os Es­tados Unidos/Otan, no que diz respeito às questões geoestratégicas.

Digamos que a Itália, há 20 anos, vive em um status quo imperante que impe­diu ao próprio PD de ser um verdadeiro partido social-democrata, tornando-se, cada vez mais, um partido que renegou sua história e seus ideais, para convergir com mais rapidez e dinâmica ao centro, isto é, em direção do poder para ser acei­tado pelo mercado para governar.

É evidente que o processo de transfor­mação política que os partidos italianos, em particular o PD e o Força Itália, acei­taram e estimularam teve consequências trágicas, no sentido que o chamado “as­senso político popular”, na realidade, de­sapareceu. Hoje, os partidos se movem seguindo as regras do marketing elei­toreiro para implementar programas de governo que, na realidade, foram defini­dos por diferentes “centros de excelên­cias”. Nesses programas o imperativo são as fórmulas que os políticos devem im­plementar para garantir o “controle so­cial” permitindo, assim, cada vez mais lu­cro a certos tipos de grupos empresariais e a estabilidade financeira para específi­cas camadas da sociedade.

Nesse sentido, as reformas sociais e econômicas são totalmente desvirtuadas e manipuladas. Por exemplo, a reforma do ensino universitário (Reforma Gelmi­ni) não foi feita para incentivar a pesqui­sa nas universidades ou para elevar os níveis do ensino. Na realidade, essa re­forma serviu para transformar as uni­versidades públicas em “escolões”, reti­rando delas os estudantes-trabalhado­res com a redução dos cursos universitá­rios de cinco para três anos. Ao mesmo tempo era introduzido um seleto proces­so de “elitização” com os mestrados de especialização, que se tornaram uma ex­clusividade das faculdades particulares. Porém, os problemas mais graves da Itália estão nos setores que se relacio­nam com o desenvolvimento industrial que tem muito a ver com a ampliação do desemprego e com a saída do mercado do trabalho dos trabalhadores que estão na faixa etária entre 45 e 60 anos. Ho­mens e mulheres que estão desempre­gados não por serem velhos, mas por­que seus custos trabalhistas são maio­res dos que os empresários pagam por um jovem de 20 anos, que trabalha com contratos flexibilizados ou até no mer­cado negro (sem contrato).

Diante disso tudo e com muita razão, Marco Travaglio denunciou que: “As reformas de Renzi viraram um sonho para os italianos, algo para não entrar no desespero. E foi com esse sonho que Renzi e os políticos do seu grupo, ago­ra, pretendem continuar a seduzir seus eleitores”.

A denúncia de Travaglio, infelizmen­te, tem sentido visto que o governo Ren­zi não encontrou resistências na socieda­de, tanto para propor a venda das últi­mas empresas públicas quanto para ten­tar anular o peso político de referendos populares que impeçam a privatização das empresas públicas de água.

Não há dúvida que nos próximos “1000 dias de Matteo Renzi” quase todas as em­presas públicas serão vendidas para per­mitir ao governo fazer caixa, já que, no dia 30 de agosto, o primeiro-ministro as­sinou um decreto que veta ao funciona­lismo público aumentos de salários, que desde 2007 permanecem congelados. Um decreto que foi feito, simplesmente, por que o Ministro do Tesouro disse que “os aumentos salariais do funcionalismo inviabilizam as metas e os custos fixados pelo governo no orçamento de 2015 e as­sim por diante”

Quer dizer, a Itália está a um passo da bancarrota.

Um PD neoliberal?

Durante a presidência de Pierluigi Ber­sani e antes dele de Massimo D’Alema e Walter Veltroni sempre houve uma luta no seio do PD, em que a parte majoritária do partido pretendia adequar à lógica so­cial-democrata a nova realidade do país, enquanto uma acirrada minoria queria fazer o salto para frente cortando o pas­sado de esquerda para assumir o neolibe­ralismo, tal como fez Tony Blair.

A pressão eleitoral da direita e do pró­prio Berlusconi, na realidade, impediram que no seio do PD se chegasse a um ver­dadeiro debate sobre o futuro do partido. Por isso, a falsa unidade partidária do PD e a degeneração da própria história polí­tica geraram no seio do partido uma sé­rie de contradições que, em 2012, foram sabiamente recolhidas por novos grupos políticos que nunca se identificaram com a história do antigo PCI ou com a política da social-democracia.

Eram os grupos “progressistas” da De­mocracia Cristã, que, após o desmante­lamento desse partido em 1999, haviam encontrado no PD uma nova “igreja po­lítica onde organizar seu futuro político”.

Renzi, os ministros de seu governo e os membros do novo secretariado do PD, bem como os principais dirigentes regio­nais desse partido pertencem a esse no­vo fluxo que não vê nenhum problema em negociar com Berlusconi ou conviver com partidos de direita.

Por isso, muitos italianos, hoje, ques­tionam o PD e o próprio primeiro-minis­tro querendo saber deles que futuro es­tão preparando para a Itália, já que o país está correndo o risco de ficar “comissa­riado” pela União Europeia e submergi­do por impostos e cortes orçamentários para cumprir com as metas financeiras fixadas em Bruxelas.

Porém, é necessário dizer que o su­cesso de Matteo Renzi no seio do PD, fi­nalmente, fez com que o Partido Demo­crata perdesse todas as ambiguidades e as fascinações que Massimo D’Alema e Walter Veltroni haviam perpetrado para não perder o voto do tradicional eleitora­do de esquerda e, portanto, não alienar a simpatia das novas gerações que acre­ditaram na necessidade de transformar o PCI em PDS (Partido Democrata da Es­querda) e depois em simples Partido De­mocrata sem perder suas conotações de esquerda. Infelizmente, deu tudo errado.

Por trás dos spots midiáticos de Renzi, o programa neoliberal de sempre

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