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sexta-feira, 19 de abril de 2024

Artigo: Boas práticas para o uso eficiente de fertilizantes

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23/04/2014 11h17 – Atualizado em 23/04/2014 11h17

Por: Renato Roscoe¹ do Fundação MS

O crescimento da produção de alimentos, fibras e energia é, sem dúvidas, o maior desafio da humanidade. Principalmente porque é inadmissível fazê-lo sem preservar a base de recursos necessária à sobrevivência digna das gerações futuras. Neste contexto, um dos insumos mais importantes para o crescimento da produtividade das culturas é o fertilizante.

A produção agrícola depende de nutrientes extraídos do solo pelas plantas e exportados nos grãos, frutos, carne, leite, fibras. A disponibilidade desses elementos químicos está relacionada com a fertilidade natural dos solos e com as aplicações de corretivos e fertilizantes. Manejar adequadamente a fertilidade de um solo é lançar mão de tecnologias que permitam a melhoria dos solos pobres e a manutenção do potencial produtivo dos solos férteis.

As “Boas Práticas para Uso Eficiente de Fertilizantes” (BPUFs) foram discutidas na última semana em evento do Instituto Internacional de Nutrição de Plantas (IPNI), realizado na cidade de Dourados, Mato Grosso do Sul, em parceria com Fundação MS e Universidade Federal da Grande Dourados. O IPNI realiza esses eventos nas diversas regiões produtoras do Brasil, com o objetivo de difundir as BPUFs, as quais são baseadas nos sistema 4C de Nutrição de Plantas: fonte certa, na dose certa, na época certa e no local certo.

O conceito é bastante interessante e aplica ferramentas de gestão estratégica ao uso racional de fertilizantes, visando o melhor retorno econômico e social, com menor impacto ambiental. Embora baseada em princípios de alta densidade científica, o que chama a atenção nessa discussão é o seu caráter prático.

Foram destaques no simpósio os desafios da gestão da fertilidade do solo em agricultura de precisão, a aplicação de fertilizantes a lanço (sobretudo os fosfatados), as estratégias de correção da acidez do solo e condicionamento de perfil, além das recomendações para soja, milho safrinha e cana de açúcar. As apresentações podem ser baixadas do site do IPNI (www.brasil.ipni.net).

Dentre os vários pontos discutidos, ressalto dois que julgo bastante relevantes. Primeiro os desafios para a correta utilização das ferramentas de agricultura de precisão na gestão 4C e BPUFs. O mapeamento da fertilidade do solo, criando zonas de manejo, é uma estratégia interessante para a utilização adequada dos fertilizantes, sobretudo distinguindo as quantidades (dose certa) a serem aplicadas em cada faixa (local certo). Entretanto, há vários desafios. O número de amostras geralmente é pequeno, o que não permite modelar adequadamente a dependência espacial. Muitas vezes a amostragem é feita com vários pontos em um quadrante (a cada 3 ou 4 hectares), sendo considerado o ponto central na modelagem e não o quadrante como um todo. Ressalta-se, ainda, a precisão das análises laboratoriais, as quais podem ter variações muito grandes de um laboratório para outro.

Quanto aos sistemas de distribuição de fertilizantes em taxa variável, há equipamentos com precisão ruim e estamos pecando muito na regulagem e, sobretudo, na manutenção. Os equipamentos mais precisos são caros em relação à sua capacidade operacional. A curta janela de plantio, tanto de safra quanto de safrinha, pressiona por agilidade nas operações. Com isso as manutenções e limpezas periódicas, assim como a revisão da calibração dos equipamentos, ficam prejudicadas. A velocidade de trabalho e erros na sobreposição de faixas também têm gerado significativas falhas na distribuição.

Essa mesma pressão por agilidade nos processos nos levam a um segundo ponto que destaco das discussões no evento. Aplicações de fertilizantes a lanço têm sido largamente adotadas, sem que se tenha cuidado com as suas possíveis restrições. Nem todas as situações permitem aplicações a lanço dos fertilizantes e, para alguns elementos, ela é crítica. Solos que ainda não estão devidamente corrigidos, ou seja, possuem acidez elevada e níveis de fósforo e potássio de médio para baixo, não devem receber adubações desses nutrientes a lanço, sem incorporação. Nesses solos, as adubações a lanço em área total são recomendadas somente na ocasião da correção, quando há a devida incorporação dos corretivos e de fertilizantes em doses adequadas para atingir os níveis altos.

As adubações a lanço em área total com fósforo e potássio somente são recomendadas na manutenção, quando os teores desses nutrientes no solo já se encontram em níveis altos. Mesmo assim, a aplicação de fósforo a lanço é motivo de discussão entre os especialistas. O fósforo é pouco móvel no solo e tende a se acumular nas camadas superficiais. O problema é que, como essa aplicação é recomendada somente para solos corrigidos, os desbalanços da aplicação superficial de P surgem somente em quatro ou cinco safras. No início, as plantas consomem as reservas construídas há vários anos nas camadas mais profundas. A reposição sendo feita somente na superfície gera o acúmulo nos primeiros centímetros de solo. Este, por sua vez, estimula a concentração do sistema radicular na camada superficial, rica em P. Com isso, as plantas ficam mais sensíveis a déficits hídricos, comuns nas regiões produtoras do Centro-Sul do Brasil. Essa situação torna-se muito mais crítica para as culturas de safrinha.

Vários outros pontos interessantes foram abordados, mas carecem de mais espaço para sua discussão. Os dois pontos destacados estão entre os mais relevantes, mas evidentemente outros podem ser tão importantes quanto. Os produtores e profissionais que utilizam agricultura de precisão devem estar atentos aos conceitos básicos para uma boa representatividade nas amostragens, rigor nas análises laboratoriais e modelagem adequada dos dados. As aplicações em taxa variada devem ser aprimoradas, com atenção nas limitações dos equipamentos, regulagem adequada e manutenção periódica. Da mesma maneira, aplicações a lanço de fertilizantes devem seguir um rigoroso acompanhamento, sobretudo para evitar o acúmulo de fósforo em superfície.

Os conceitos de BPUFs são bastante interessantes e remetem a estratégias de utilização racional dos fertilizantes, evitando perdas de produtividade e aproveitando melhor os recursos naturais. Certamente constituem ferramentas de gestão que muito podem contribuir para produtividades e rentabilidades dos produtores rurais.


  1. Renato Roscoe é engenheiro agrônomo (UFV, 2005), mestre em ciência do solo (UFLA, 1997) e doutor em environmental sciences (Wageningen University And Research Centre, 2002). Atua como diretor executivo e pesquisador no setor fertilidade do solo na Fundação MS.

Foto: Fundação MS

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