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Filhos? Não, obrigada.

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27/11/2016 08h30

Por Raquel Novaes

Fonte:Por Raquel Novaes

Quando a gente é criança – principalmente menina – aprende que, quando crescer, vai casar e ter filhos. Durante toda a infância brincamos com bonecas e cuidamos delas como se fossem filhinhas. Depois a gente cresce, vai para a faculdade, começa a se interessar pela carreira e se empenhar no trabalho. E não importa o quanto você esteja se saindo bem nesse caminho, todo mundo te pergunta: “E o namorado? Quando vai ser o casamento?” E você, para não responder o que está com vontade, respira fundo e faz uma cara de paisagem. Aí você encontra um cara legal e resolve ficar com ele definitivamente. E a pergunta que ouve passa a ser: “Quando vem o bebê? Vai ficar para titia?”

O que sempre me intrigou foi essa obsessão por casamento e filhos. Por que simplesmente as pessoas não te perguntam: “Como você está? Está feliz?” Como se sinônimo de felicidade fosse casar e ter filhos!

E a situação piora quando sua resposta não é o que os outros querem ouvir: “Não, eu não quero ter filhos”. Aí o mundo desaba, acontece o apocalipse e você é condenada, passa a ser a pior pessoa do universo, insensível, sem coração, fria.

Uma vez, uma amiga (veja bem, uma amiga!) me disse que eu era egoísta. Nunca entendi isso… como assim, egoísta? Egoísta com quem? Com o mundo, em não querer colocar mais um ser humano no planeta? Egoísta com a humanidade por não ajudar em sua continuidade? Penso que egoísta eu seria se tivesse um filho e negligenciasse a educação dele para cuidar só de mim. Mas o filho nem existe! Como posso ser egoísta?

Aliás, conheço muita gente assim, que delega a educação dos filhos. O sonho era só engravidar? Só ver o filho nascer? Assim é fácil… não gostaria de ser uma mãe que deixasse nas mãos de babás, escola, avós os ensinamentos a meu filho. Se eu tivesse – ou tiver – um filho, gostaria de ser a melhor mãe do mundo. Mas me parece que muitas vezes ter filho é status, serve para dar uma resposta à sociedade, é dever cumprido, só isso.

Não sou muito boa com números, mas para mim é claro que há duas possibilidades: você pode escolher ter filhos ou não. É 50% de chance pra cada lado. Se existe essa opção, por que você não tem direito de escolhê-la? Parece que as mulheres são obrigadas a querer ter filhos. Se não tiver, só é perdoada se não pode, se tem alguma doença… Se simplesmente não quer, está condenada.

Enquanto a filha é só a boneca, a vida é muito bonita, tudo dá certo, o mundo é um lugar seguro e acreditamos que seremos felizes para sempre. Só que aí você cresce e vê que não é bem assim, que existem coisas que muita gente acha normal, mas com as quais você não concorda, há valores que para você são importantes e quase ninguém mais tem. Aí você cai na real e vê a questão da maternidade com outro olhar, menos romântico, mais prático. Como criar filhos num mundo assim? A ideia de brincar de boneca pra sempre começa a ser colocada em xeque.

Mas acho que esse sonho de princesa – que, sem que a gente perceba, vira quase uma obrigação de ser mãe – e que permeia toda a infância, adolescência e até a vida adulta das mulheres, deixa pouco espaço para questionamentos, para a realidade.

Muitas das minhas amigas, enlouquecidas por engravidar, vivem repetindo: “Quero ter um bebê, quero ter um bebê!” Depois que parei para pensar sobre ser mãe ou não, considero a seguinte questão: não, você não vai ter um bebê. Vai ter um filho. Vai ser bebê durante dois anos, depois cresce. Ou alguém sonha em ter um adolescente? Nunca ouvi nenhuma delas dizendo isso…

Tem também a ideia de não dormir direito nunca mais, que não me agrada. A meu ver, no começo você não dorme porque a criança chora à noite. Depois, fica doente, vai pra sua cama procurando conforto. Cresce um pouco e o motivo de te tirar o sono muda: vai pra escola, pode não conseguir fazer amigos, briga, tem problemas. Depois você perde o sono preocupada se seu filho está bebendo, usando drogas… Daí você não dorme porque ele não conseguiu entrar na faculdade, depois porque não consegue arranjar um emprego… e por aí vai. Esses cenários são todos negativos? Sim. Mas são perfeitamente plausíveis. Pode acontecer tudo isso, não pode? Mas também já ouvi: “Isso é pequeno perto do que se sente, é um amor sem limites, que você nunca imaginou sentir, que supera tudo isso.” Acredito. Piamente. Mas não quero.

O curioso é que hoje em dia há um discurso muito forte sobre aceitação. Todo mundo tem direito a ser o que quiser, ter a opinião que tiver… mais ou menos. Hipocrisia. A sua opinião é aceita se for igual à dos outros, ou se for o que querem ouvir. Se for diferente, deixa de ser opinião e passa a ser preconceito. Para mim, preconceito não é opinião diferente. Preconceito é emitir uma opinião sem conhecer o assunto ou sem parar para pensar no que está sendo dito.

Num mundo com tanta diversidade, preconceito é crer que há um padrão universal que deve ser seguido por todos, o que é bom para um é bom para todo mundo. Há mulheres que acham melhor não ter filhos. E a escolha delas é pessoal, legítima e não diz respeito a mais ninguém. Por que essa decisão não pode ser respeitada? Tem sempre que vir rotulada? E, pior: geralmente os comentários e olhares de reprovação partem de outras mulheres! Parecem se sentir ofendidas…

Não, obrigada, mas não quero criar filhos num mundo assim.

Enfim… acho que tudo seria melhor se, em vez de perguntarem quando vai ser o casamento ou quando vem o bebê, as pessoas se preocupassem em saber, apenas, se o outro está feliz. Porque há felicidade, sim, fora dos ditos padrões. E, afinal, é isso o que importa, não é?

Raquel Novaes é jornalista. Apresentadora do Edição das 10, na Globonews.

Filhos? Não, obrigada.

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