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quinta-feira, 25 de abril de 2024

Racismo sem reticências

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16/11/2015 07h00 – Atualizado em 16/11/2015 07h00

Crônicas de uma Alma Solta

Por Luiz Peixoto

“Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele,
por sua origem ou ainda por sua religião.
Para odiar, as pessoas precisam aprender,
e se podem aprender a odiar,
elas podem ser ensinadas a amar.”

(Nelson Mandela)

Eu gosto de usar reticências quando escrevo… esses três pontinhos tem a magia de possibilitar a imaginação. Uma amiga disse que eu uso demais. Como levo a sério o que os amigos falam, parei para pensar no assunto. Um texto é uma expressão de um desejo, de uma vontade, de uma necessidade de se manifestar. E em algumas ideias, as reticências podem ser, de fato, interpretadas erroneamente, podem dar margens a falsas visões da realidade. Sugestão acatada. Seguirei pensando em pontinhos, mas tentarei ser mais direto, sem muita volta ao escrever. Por isso que gosto dos meus amigos, eles me ensinam todo dia.

Pensando nas falsas interpretações, lembrei-me de um fato ocorrido em 2002. Morando em Goiânia, trabalhando em uma ONG internacional, com um salário relativamente alto, resolvi comprar um aparelho televisor de última geração, havia acabado de chegar as lojas essas TVs finas (não sei a diferente até hoje entre LED, LCD etc). La fui-me, como sempre ando em dias de folga, de bermuda velha (são sempre as mais confortáveis), camiseta já gasta e chinelo de dedo, afinal andar na rua, no calor desértico da capital goiana é um desafio. Entrei na loja, de uma rede de eletroeletrônicos bastante conceituada em Goiânia e em Brasília. Olhei a TV. Avaliei o preço e minhas posses. Decidi comprar. Pasmem, nenhum vendedor veio me atender. Esperei alguns minutos e chamei um vendedor. Com um expressão de descaso, olhou-me de cima a baixo e disse o preço, e acrescentou a expressão “mas é à vista”, dando-me as costas em seguida. Entendi na hora que o vendedor, e por consequência, a loja, já havia me avaliado e concluído que eu não tinha dinheiro para a compra. Como lojas existem várias, atravessei a Avenida Anhanguera e comprei na loja popular na frente. Nunca esqueci isso. Fui julgado e avaliado pela roupa. Nem ouviram a minha voz.

Sou uma pessoa de relativa inteligência. Estudo e penso sobre a vida e as pessoas há muito tempo, faço um esforço em compreender vários fenômenos sociais e relacionais. Compreender não é aceitar, é apenas perceber como e porque elabora-se e pensa-se em determinada direção. Nunca compreendi o porquê das pessoas serem avaliadas pela roupa, pelas posses, pela cor, entre outras diferenças perceptíveis a olho nu.

Também nunca compreendi a lógica do racismo. Se é que um racista usa de alguma lógica. Racismo se supõe o entendimento que um grupo humano, por ser de uma determinada etnia, é superior a outro, de outra etnia. Pelo menos é a essa conclusão que cheguei lendo alguns clássicos sobre o assunto. E isso, definitivamente, não tem lógica, é uma burrice, uma estupidez sem tamanho.

Quando alguém começa uma frase dizendo “Não tenho nada contra negros, mas…”, “Não tenho nada contra índios, mas…”, seja nas redes sociais ou ao vivo, percebo estar frente a um racista. Seja assumido ou enrustido. Ou ainda a expressão estranha “Não sou racista, tenho amigos negros”. Como diriam alguns amigos meus: “Para que tá feio”. O seu mas não passará incólume na vida, não impedirá que a luta por afirmação étnica continue, não limitará as conquistas do povo negro e do povo guarani, seja em Amambai ou onde for. Seu mas só te tornará mais um beócio na vida.

Na semana da celebração da Consciência Negra, deveríamos refletir sobre nossas posturas frente à diversidade. Seja étnica, cultural, sexual, de gênero ou geracional. Até onde irá nossa capacidade de ser humanos em relação aos outros humanos? Como disse a cantora baiana Pitty “pois eu não volto pra cozinha, nem o negro pra senzala, nem o gay pro armário. O choro é livre (e nós também)”. Quanto a isso, não cabem reticências, apenas ponto!

“A carne mais barata do mercado é a carne negra
Que vai de graça pro presídio
E para debaixo do plástico
Que vai de graça pro subemprego
E pros hospitais psiquiátricos”
(Seu Jorge)

Luiz Peixoto é Filósofo, pós-graduado em Pedagogia da Alternância. Amambaiense. Professor e Educador

Racismo sem reticências

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