Antes de mais nada, penso que devo me apresentar. Chamo-me Viviani Araújo, sou professora formada e pós-graduada no ensino de Arte. Mas também tenho como base a formação do Magistério e Normal Superior (ambos cursos já extintos. O primeiro, Ensino Médio profissionalizante e o segundo, tinha como objetivo, dar formação superior/acadêmica aos professores considerados leigos, ou seja, apenas com o magistério.)
Há algumas semanas, vi num grupo de troca de informações de professores do Estado do MS, um colega pedindo ajuda com sua disciplina: Literatura, Arte e Movimento. Ao ver a palavra ARTE, senti em meu coração que podia ajudá-lo e sendo assim me coloquei a disposição no WhatsApp e fui tirar um cochilo pós- almoço. Ao acordar levei um susto, pois meu celular estava cheio de outros colegas também pedindo ajuda. Então eu pensei, “putz, arrumei sarna pra me coçar!” Tendo em vista que estou readaptada e não consigo passar longos períodos sentada ou em pé. Comecei a conversar com alguns colegas da área, a coordenação da escola e enfim fui olhar os livros didáticos e o medonho Organizador Curricular. Feito isso, fiz uma organização para o 1º bimestre de cada ano do ensino fundamental (6º ao 9º ano) aliando o que a BNCC pede e ao que o livro didático apresenta. Não foi fácil! E compartilhei com os colegas que imploravam por socorro.
Primeiro susto: 6º ao 9º ano não estudam mais a História da Arte, agora estudam Linguagens: Artes Visuais, Dança, Música e Teatro. Na BNCC diz “Essas linguagens articulam saberes referentes a produtos e fenômenos artísticos e envolvem as práticas de criar, ler, produzir, construir, exteriorizar e refletir sobre formas artísticas.” Muito bem! E acrescenta “As habilidades são organizadas em dois blocos (1º ao 5º ano e 6º ao 9º ano), com o intuito de permitir que os sistemas e as redes de ensino, as escolas e os professores organizem seus currículos e propostas pedagógicas com a devida adequação aos seus contextos”. Maravilha! Nada melhor que organizar um currículo com quem entende e tem experiência, ou seja, professores que estão em sala e sabem exatamente o que o aluno precisa para avançar. Porém, na prática não é isso o que acontece ou aconteceu com o organizador curricular. Colegas de diferentes áreas do conhecimento concordam que a BNCC não atendeu as sugestões que demos quando fomos convidados à estudá-la.
Segundo susto: Fala da coordenação “deve-se usar somente o livro de didático. Atividades práticas não podemos fazer porque não podemos pedir material para os alunos”. Um turbilhão de coisas me veio à cabeça. Aula de arte engessada ao livro didático e sem produção artística e prática? Como ministrar uma aula de Arte minimamente atrativa, dentro do pensamento de Ana Mae Barbosa (o fazer, o apreciar, o contextualizar e o fruir)? Pânico total dentro da minha veia de arte-educadora. Por isso, tomei a atitude de escrever esse texto.
Fiz algumas reflexões a partir do que conversei com alguns colegas e dentro do que observei no Organizador Curricular, dentro do livro adotado pela escola e dentro da realidade que vivemos no Estado do MS. O conteúdo do livro fala das Linguagens, porém é fragmentado. Não há uma sequência didática. E eu sou da opinião que o conhecimento se constrói na prática, na vivência. O que o livro oferece é um conhecimento que nossos alunos ainda não têm maturidade para absorver. Os profissionais desta área a maioria são formados em Artes Visuais (dentro do Estado) e temos um currículo que favorece de forma majoritária Música, Dança e Teatro nos 4 bimestres. Agora vamos pensar numa escola recebendo profissionais da área de Arte, sem experiência, com uma formação de dois anos e à distância. Não estou desmerecendo esses colegas, não me interpretem mal. Mas é a realidade que estamos vivendo. As Habilidades são determinadas por códigos, o que antigamente era os objetivos (o que queremos que nosso aluno aprenda) e o Objeto do Conhecimento, seria os conteúdos. Uma mudança de nomenclatura que deu “Tilt” no cérebro.
Aí temos um governo (e não me refiro a presidente A ou B) preocupado com índices e não com a qualidade do ensino. Preocupado em implantar um ensino integral, sem saber da realidade de cada estado e município, sem dar suporte a este sistema de educação, e que tira a liberdade dos pais em escolher onde querem matricular seus filhos. Para completar com chave de ouro, o ensino fundamental (1º ao 5º ano) não é mais oferecido pelo Estado e profissionais efetivos nessas turmas ficaram à deriva. Ninguém (Estado) sabe o que fazer com eles. São situações como essas que matam a nossa educação dia após dia. Não convida mais as pessoas a quererem ter o magistério como profissão. Colaboram para que os neófitos tenham experiências traumatizantes dentro do âmbito educacional. Mas quem sou eu, né? Sei que sou uma ínfima gota de água no oceano e que ninguém vai me ouvir, ou que um sistema inteiro vai mudar, porque vejo coisas que não funcionam e não se adequam a nossa realidade, mas de um jeito ou de outro tem que passar na nossa garganta. Mesmo assim, eu precisava falar, mesmo assim eu precisava manifestar a minha indignação.
Prof. Viviani Araújo
Amambai-MS, 05/03/25.